Terreiro de Umbanda em Barra Velha sofre ameaça com apologia ao nazismo: Polícia investiga e líder religioso desabafa sobre primeira agressão em mais de 40 anos de fé
- Barra Velha Online
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Por Daniela Meller | Barra Velha – SC
Na madrugada desta quarta-feira (07), o silêncio habitual da Casa de Ogum e Iansã, no bairro Quinta dos Açorianos, em Barra Velha (SC), foi rompido por uma ameaça que vai além do ataque individual: uma afronta à liberdade religiosa. Afixada na parede do terreiro, uma mensagem anônima, assinada por um suposto grupo extremista, associava símbolos e linguagem de inspiração nazista com intolerância religiosa direta contra o espaço de culto da Umbanda.
O texto, com erros gramaticais e conteúdo violento, foi encontrado pelo dirigente da casa, Adailton da Rocha, conhecido como Pai Rocha. Leia o conteúdo, na íntegra:
“Partido integralista. Vinhamos, por meio desta carta aberta, convidá-los para se retirar de nosso (TERRITÓRIO CRISTÃO). caso contrário iremos destruir tudo e todos..
Isso não foi uma ameaça mais não espere uma
Espere o ato! Não nos subestime. Foi apenas um aviso
Atenciosamente: Partido Nacional Integralista dos Trabalhadores Brasileiros. Deus, Pátria e um FUHRER”
Em entrevista exclusiva ao portal danimeller.com o Pai Rocha disse que ao tomar conhecimento do teor da carta, procurou imediatamente a Polícia Civil e registrou um boletim de ocorrência. O caso está sendo investigado como crime de ameaça, com possíveis desdobramentos por apologia ao nazismo e intolerância religiosa.
A trajetória de uma casa fundada na fé e no acolhimento
A Casa de Ogum e Iansã foi fundada há quase sete anos no bairro Quinta dos Açorianos, mas sua história é longa e marcada pelo trabalho espiritual e social. Pai Rocha, de 61 anos, conduz os trabalhos há mais de quatro décadas. Ele relata nunca ter enfrentado, até agora, qualquer tipo de ataque:
"Essa é a primeira vez que a gente sofre esse tipo de ataque de intolerância religiosa. Eu estou nessa caminhada espiritual há mais de 40 anos. Temos a casa aqui em Barra Velha, a Tenda de Pai Benedito em Canoinhas, e a Casa de Oyá em Criciúma. Nunca passamos por isso antes", conta.
A casa promove atendimentos espirituais quinzenais, abertos à comunidade. Nos demais dias, realiza trabalhos internos de desenvolvimento mediúnico. Além disso, mantém ações sociais, arrecadando e distribuindo alimentos, roupas e brinquedos para famílias em situação de vulnerabilidade.
“A Umbanda é caridade. Nosso trabalho é ajudar as pessoas a se fortalecerem espiritualmente. Atendemos gente com problemas familiares, emocionais, espirituais. Deus é um só. Nós cultuamos os orixás, que são forças da natureza criadas por Deus. Pedimos a ajuda deles para auxiliar quem nos procura”, explica Pai Rocha.
Ele também reforça a boa convivência com os vizinhos, inclusive de outras denominações religiosas:
"Temos evangélicos como vizinhos com quem nos damos muito bem. Nunca tivemos conflito. Essa ameaça é um choque pra todos nós", desabafa.
Polícia Civil investiga o caso
A delegada Milena de Fátima Rosa, responsável pelas investigações, confirmou o recebimento da denúncia e detalhou os próximos passos:
“O boletim foi registrado na tarde desta quarta-feira. A vítima será ouvida em cartório, assim como testemunhas. Vamos identificar os autores do fato. A mensagem tem elementos que apontam para crime de ameaça e, possivelmente, apologia ao nazismo. A águia utilizada é um símbolo comum nesse tipo de ideologia, mesmo sem a suástica”, explicou.
Casos como esse podem ser enquadrado em crimes contra o livre exercício de culto:
Art. 208 do Código Penal: vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso ou impedir/perturbar cerimônia religiosa. Pena: detenção de 1 mês a 1 ano ou multa.
Lei 7.716/1989 (Crimes de Discriminação Racial e Religiosa): prevê pena de reclusão de até 5 anos para quem impedir ou dificultar o exercício de religião por motivo de discriminação.
Apologia ao nazismo: também configurada pela Lei 7.716/1989, com pena de reclusão de 2 a 5 anos para quem fabricar, comercializar ou divulgar símbolos do regime nazista.
Resistência e fé seguem firmes
Mesmo diante da ameaça, os trabalhos na Casa de Ogum e Iansã continuam. No próximo sábado (10), será realizada a tradicional festa em homenagem a Ogum (23 de abril) e Preto Velho (13 de maio), unindo as datas em um evento aberto à comunidade.
"A gente sempre abre as portas para todos. Tem feijoada, tem música, tem fé. A religião não pode ser motivo de medo, tem que ser motivo de união", afirma Pai Rocha.
Ele faz um apelo para que casos como este sirvam de alerta e transformação:
“Não queremos vingança, queremos justiça e respeito. E que isso nunca mais aconteça com nenhum terreiro, nenhuma igreja, nenhum centro. O Brasil é um país de fé e precisa aprender a conviver com todas elas.”
Como denunciar casos de intolerância religiosa:
Disque 100 (Direitos Humanos): atendimento anônimo e gratuito.
Delegacias de Polícia: registre o boletim e informe todos os detalhes.
Ministério Público ou Defensoria Pública: também podem acompanhar casos de violações de direitos.
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